16/03/2022
Bottom line: O Banco Central elevou a taxa Selic em 100bps na reunião de março, levando-a a 11,75%a.a, e sinalizou movimento de mesma magnitude em sua próxima reunião. Alongando o horizonte de cumprimento da meta de inflação, sempre argumentamos que o Banco Central ficava mais expostos a choques, sem espaço suficiente de manobra. As grandes apostas eram nos efeitos defasados do aperto monetário já ocorrido e na potência de sua sinalização futura. Com a informação atual, resulta claro que o Banco Central foi atropelado pelos fatos. Revisamos nosso call de Selic terminal para 13,25% em 2022, com movimentos adicionais em maio (100bps) e junho (50bps), mantendo este patamar de juros até meados de 2023.
O Banco Central elevou a taxa Selic em 100bps na reunião de março, referendando a sua sinalização prévia e as expectativas de mercado, levando-a a 11,75%a.a. Ao contrário do ocorrido na reunião de fevereiro, o Banco Central antecipou mais um ajuste de mesma magnitude em sua próxima reunião. Temos comentado há algum tempo que a estratégia oficial era arriscada, reduzindo o ritmo de elevação dos juros em momento de divergência inflacionária – tanto das expectativas como da inflação corrente – e de sucessivos choques que tornam o cenário prospectivo muito nebuloso.
O Banco Central tentou jogar “água na fervura” ao dizer que os choques atuais devem ser encarados com serenidade, ou seja, sem reações exacerbadas que possam se mostrar rapidamente equivocadas. Nisto, entendemos que o Banco Central está correto. No entanto, continuamos vendo um cenário onde o Banco Central enxerga excessiva potência de seus instrumentos, com uma inflação de preços livres que ainda parece baixa frente à estrutura de choques em curso. Oficialmente, abre-se espaço para um orçamento maior do que o pretendido se os choques se mostrarem maiores ou mais persistentes; o fim do ciclo está em aberto.
Alongando o horizonte de cumprimento da meta de inflação, sempre argumentamos que o Banco Central ficava mais expostos a estes choques, sem espaço suficiente de manobra. A grande aposta era nos efeitos defasados do aperto monetário já ocorrido, e na potência dos ajustes futuros, já sinalizados, para manter expectativas ancoradas e a formação de preços disciplinada. Com a informação atual, resulta claro que a aposta da autoridade monetária deu errado; o Banco Central foi atropelado pelos fatos e fica cada vez mais difícil entregar convergência com uma inflação que permanece tanto tempo longe das metas estabelecidas pelo CMN.
Hoje, esperamos inflação de 5,7% em 2022, bastante abaixo do cenário oficial, mas nisto incluindo um abandono da bandeira de emergência hídrica em abr/22. Caso isso não ocorra, o cenário já migra, tudo mais constante, para uma projeção no entorno de 6,5% neste ano. Os choques em curso trazem assimetria negativa tanto para a inflação de preços livres (alimentos e bens industriais transacionáveis) como para a de preços administrados (combustíveis, a depender de decisões políticas que possam reduzir custos no curto prazo, mas aumentar riscos, fiscais e inflacionários, a médio prazo).
Em conclusão, revisamos o nosso call de Selic terminal para 13,25%, a ser atingida em mais dois movimentos de 100bps (maio) e 50bps (junho). Esperamos que a Selic se mantenha neste patamar até meados de 2023, quando um suave ciclo de cortes poderá levar a taxa terminal do ano que vem para 11,25%a.a. Somente assim os nossos modelos conseguem colocar a inflação em trajetória consistente com o cumprimento das metas tanto em 2023 como em 2024. Há enorme incerteza prospectiva; tudo muda muito rápido, e os fatos têm atropelado a todos nós.
Mais detalhes seguem abaixo. Como sempre, texto anterior em vermelho e novo texto sublinhado, com grifos onde julgamos relevante.
(1) Cenário externo: Forte piora do cenário externo, com aumento da incerteza e choque de oferta derivado do conflito entre Rússia e Ucrânia que aumenta a pressão inflacionária que já acumulava no mundo
No cenário externo, o ambiente segue menos favorável. A maior persistência inflacionária aumenta o risco de se deteriorou substancialmente. O conflito entre Rússia e Ucrânia levou a um aperto monetário mais célere nos EUA, tornando as significativo das condições financeiras mais desafiadoras parae aumento da incerteza em torno do cenário econômico mundial. Em particular, o choque de oferta decorrente do conflito tem o potencial de exacerbar as pressões inflacionárias que já vinham se acumulando tanto em economias emergentes. Além disso, a nova onda da Covid-19 adiciona incerteza quanto ao ritmo da atividade, ao mesmo tempo que pode postergar a normalização das cadeias globais de produçãoavançadas
(2) Atividade doméstica: Tom benigno com a atividade do fim de 2021, sem nenhum comentário em relação ao início deste ano…
Em relação à atividade econômica brasileira, indicadores relativos aoa divulgação do PIB do quarto trimestre tiveram evolução ligeiramente melhor que a esperada, em particular os relativos ao mercado de 2021 apontou ritmo de trabalhoatividade acima do esperado
(3) Inflação e expectativas: Inflação segue surpreendendo negativamente, sugerindo maior difusão (sem destaque específico ao núcleo). Expectativas de 2022 e 2023 estão acima das metas e subindo.
A inflação ao consumidor seguiu surpreendendo negativamente. Essa surpresa ocorreu tanto nos componentes mais voláteis como principalmente nos itens associados à inflação subjacente
As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação
As expectativas de inflação para 2022 e 2023 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 56,4% e 3,7%3,5%, respectivamente
(4) Projeções condicionais (referência): Utilizando o cenário Focus, a Selic agora termina 2022 em 12,75%a.a., reduzindo-se para 8,75%a.a. em 2023. As projeções oficiais, com esse cenário de juros, subiram para 7,1% em 2022 (anterior: 5,4%) e para 3,4% (anterior: 3,2%) em 2023 – ou seja,muito acima da banda neste ano e fora da meta do ano que vem. O cenário é particularmente complicado, o que se reflete na grande oscilação das projeções oficiais. Preços administrados foram elevados para 9,5% em 2022 (anterior: 6,6%) e para 5,9% em 2023 (anterior: 5,4%); tudo mais constante, implicando em elevações de IPCA de, respectivamente 0,75p.p. (2022) e de 0,13p.p. (2023). Nota-se, portanto, que a inflação de preços livres manteve-se praticamente parada em 2023, mas subiu para 6,3% (anterior: 5,0%) em 2022.
No cenário de referência, com trajetória para a taxa de juros extraída da pesquisa Focus e taxa de câmbio partindo de USD/BRL 5,4505*, e evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC), as projeções de inflação do Copom situam-se em 5,47,1% para 2022 e 3,4%,3,2% para 2023. Esse cenário supõe trajetória de juros que se eleva para 12,75%12,00% no primeiro semestre de 2022, termina o ano em 11,75% em 2022 e reduz-se para 8,75%,8,00% a.a. em 2023. Nesse cenário, as projeções para a inflação de preços administrados são de 6,69,5% para 2022 e 5,9%, 5,4% para 2023. Adota-se a hipótese de bandeira tarifária “vermelha patamar 1amarela” em dezembro de 2022 e dezembro de 2023.
(4.1.) Projeções condicionais (alternativo): Em ambiente tão peculiar, o COPOM traçou outro cenário no qual utiliza das curvas futuras de petróleo como parte da sua projeção de preços administrados – o que parece ser mais razoável e muito mais próximo de nossa abordagem. Com isso, ainda que sem abrir as componente de livres e administrados, a inflação projetada se reduziu para 6,3% em 2022 e para 3,1% em 2023. Tal cenário nos parece mais razoável, ainda que exista grande incerteza quanto ao comportamento dos preços administrados no curto prazo. Nossa projeção mais recente de inflação para 2022 é de 5,7%, mas incorporamos corte de bandeira tarifária de energia elétrica em abr/22, antes do fim da emergência hídrica (o que, por si, ajuda na inflação anual em aproximadamente 0,80p.p.)
Diante da volatilidade recente e do impacto sobre as projeções de inflação de sua hipótese usual para o preço do petróleo em USD**, o Comitê decidiu adotar também, neste momento, um cenário alternativo. Nesse cenário, considerado de maior probabilidade, adota-se a premissa na qual o preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura de mercado até o fim de 2022, terminando o ano em US$100/barril e passando a aumentar dois por cento ao ano a partir de janeiro de 2023. Nesse cenário, as projeções de inflação do Copom situam-se em 6,3% para 2022 e 3,1% para 2023.
(5) Balanço de riscos e decisão: O balanço de riscos muda o tom do debate fiscal, postulando que parte do risco percebido pelo mercado já está embutido nas expectativas de inflação e nos preços de ativos; não estamos certos dessa visão. Elevação de juros em 100bps, como antecipado, mirando principalmente 2023 em um cenário de incerteza ainda maior do que a observada anteriormente.
O Comitê ressalta que, em seu cenário de referênciaseus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções
Por um lado, uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento nos preços das commodities internacionais em moeda local produziria trajetória de inflação abaixo do cenário de referênciados seus cenários
Por outro lado, políticas fiscais que impliquem impulso adicional da demanda agregada ou piorem a trajetória fiscal futura podem impactar negativamente preços de ativos importantes e elevar os prêmios de risco do país
Apesar do desempenho mais positivo das contas públicas, o Comitê avalia que a incerteza em relação ao arcabouço fiscal segue mantendomantém elevado o risco de desancoragem das expectativas de inflação, mas considera que esse risco está sendo parcialmente incorporado nas expectativas de inflação e, portanto, a preços de ativos utilizados em seus modelos. O Comitê segue considerando uma assimetria altista no balanço de riscos. Isso implica maior probabilidade de trajetórias para inflação acima do projetado de acordo com o cenário de referência
Considerando o cenário de referênciaos cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa básica de juros em 1,001,50 ponto percentual, para 1011,75% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete seu cenárioa incerteza ao redor de referênciaseus cenários e um balanço de riscos decom variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva, e é compatível com a convergência da inflação para as metas ao longo do horizonte relevante, que inclui oos anos-calendário de 2022 e, em grau maiorprincipalmente, o de 2023. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego
(6) Próximos passos: Há evidente tentativa de jogar “água na fervura”, ainda que reconhecendo que os juros avançaram ainda mais em terreno contracionista. O objetivo é evitar efeitos secundários do choque em curso, o que se pode entender por disciplinar as expectativas de 2023 e além. O Banco Central antecipa mais um movimento de 100bps, estritamente deixando o futuro em aberto; se os choques atuais se mostrarem maiores ou mais persistentes, haverá ampliação do orçamento pretendido. O BCB anda em gelo fino – com inflação fora das metas há muito tempo, é cada vez mais difícil entregar o trabalho…
O Copom considera que, diante do aumento de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário avancecontinue avançando significativamente em território ainda mais contracionista
A atuação do Comitê visa combater os impactos secundários do atual choque de oferta em diversas commodities, que se manifestam de maneira defasada na inflação. As atuais projeções indicam que o ciclo de juros nos cenários avaliados é suficiente para a convergência da inflação para patamar em torno da meta ao longo do horizonte relevante. O Copom avalia que o momento exige serenidade para avaliação da extensão e duração dos atuais choques. Caso esses se provem mais persistentes ou maiores que o antecipado, o Comitê estará pronto para ajustar o tamanho do ciclo de aperto monetário. O Comitê enfatiza que irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas