BRCG

Decisão de política monetária – Comunicado do COPOM (set/24): O primeiro tiro

Bottom line: O Banco Central elevou a taxa Selic em 25bps, como esperado, atingindo 10,75%a.a. O Comitê expressa renovada preocupação com a força da atividade doméstica (hiato positivo) e com o comportamento da inflação (corrente, esperada e projetada), deixando uma eventual descompressão externa (corte de juros) em 2º plano. A extensão do ciclo e o ritmo de ajuste dos juros estão em aberto. Esperamos Selic a 11,50%a.a. no início de 2025, com leve viés altista para esta projeção.

Tal como esperado e exposto em nosso Destaque BRCG mais recente, o Comitê de Política Monetária (COPOM) do Banco Central elevou a taxa Selic, de forma unânime, para 10,75%a.a. (+25bps) em sua reunião de setembro. Há uma visão mais negativa do Comitê a respeito do cenário, cristalizada em um balanço de risco assimétrico (altista) para a inflação, na revisão do hiato do produto para terreno positivo e na elevação adicional das projeções condicionais no horizonte relevante (1º trimestre de 2026) – passando de 3,2% na última reunião para 3,5% nesta reunião.

Para além dessas mudanças objetivas, tivemos ajustes sutis na comunicação. A despeito do corte de juros (mais forte) nos EUA, o cenário externo segue sendo tratado como desafiador, ressaltando não a descompressão das condições financeiras externas, mas sim a incerteza prospectiva. Além disso, houve uma mudança de tom a respeito da inflação corrente, que passa a ser vista (no headline e nas métricas subjacentes) como acima da meta – a despeito de já estar bem acima de 3,0% há muito tempo. Faz-se eco, assim, ao parágrafo 7 da última Ata do COPOM, quando o Comitê passou a definir, de forma explícita, que “números acima de 3,2% (pelo menos) estão acima da meta”.

Em termos objetivos, a revisão do cenário oficial foi alinhada ao que esperávamos. Em nossa avaliação dos modelos oficiais, exposta no Destaque BRCG, enxergávamos uma projeção de inflação para o 2º trimestre de 2024 entre 3,3% e 3,4%, o que é consistente com os números reportados pelo Comitê para o início de 2026 (3,5%). A mudança na sistemática de apresentação dos resultados é uma bem-vinda evolução da comunicação, com tabela que expõe as aberturas das projeções, entre preços livres e administrados, com premissas e resultados para o horizonte analisado.

Resta agora o debate a respeito de até onde, e como, esse ciclo avançará. No que foi a parte mais hawkish do Comunicado, o Comitê deixou claro, de antemão, que a extensão e o ritmo do ajuste estão em aberto. Uma análise mais cuidadosa das premissas de Selic no cenário oficial (de referência, abandonando por completo o cenário alternativo de juros estáveis) sugere duas coisas: (i) os cortes de juros que o FOCUS ainda têm para o segundo semestre de 2025 estão fora de cogitação; e (ii) o cenário de elevação dos juros até o 1º semestre de 2025 tende a ser um pouco mais intenso do que sugerido pelo FOCUS (o pico da Selic se dá em 11,50%a.a. no início do ano que vem, patamar mantido até meados do ano).

Em nossa avaliação do modelo oficial, uma Selic a 11,50%a.a. (mais três elevações de 25bps, e manutenção até o final de 2025) leva o IPCA projetado a 3,1% no 2º trimestre de 2026 – o que consideramos ser “em torno da meta” no horizonte relevante da próxima reunião do COPOM, em novembro. Parece haver, portanto, uma pequena assimetria altista nesse cenário de juros. De outro lado, uma Selic que atinge 12,00% até o final do 1º trimestre de 2025, como hoje precifica o mercado, coloca a projeção levemente abaixo de 3,0% no mesmo horizonte temporal.

O plano de voo do Comitê nos parece estar, portanto, em uma Selic terminal entre 11,50%a.a. e 12,00%a.a., a ser atingida até o primeiro trimestre de 2025. Seguimos, por enquanto, com o cenário de mais três elevações de 25bps na taxa básica de juros, atingindo 11,50%a.a. na reunião do COPOM de jan/25. Vamos esperar a ata, a ser divulgada na semana que vem, para calibrar a Selic terminal e, eventualmente, o ritmo de ajuste no nosso cenário-base.

Deixamos claro, por fim, que nossos modelos são menos potentes do que os oficiais; com tal orçamento de juros, enxergamos um IPCA mais próximo de 3,7% no horizonte relevante – sem cumprir a meta, mas, tampouco, sem infringir o regime.

Mais detalhes seguem abaixo. Como sempre, texto anterior em vermelho e novo texto sublinhado, com grifos onde julgamos relevante.

(1) Cenário externo: Mundo segue desafiador, com dúvidas a respeito da desaceleração econômica e da desinflação. Foco especial nos Estados Unidos, e no ritmo do FED.

O ambiente externo mantém-se adversopermanece desafiador, em função da incerteza sobre os impactos e a extensão da flexibilização da política monetáriado momento de inflexão do ciclo econômico nos Estados Unidos e, o que suscita maiores dúvidas sobre os ritmos da desaceleração, da desinflação e, consequentemente, sobre as dinâmicas de atividade e de inflação em diversos paísesa postura do Fed. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho. O Comitê avalia que o cenário externo, também marcado por menor sincronia nos ciclos de política monetária entre os países, segue exigindo cautela por parte de países emergentes

(2) Atividade doméstica: Dinamismo segue maior que o esperado, com reavaliação do hiato para campo positivo (tal como antecipamos no Pré-COPOM).

Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho segue apresentandotem apresentado dinamismo maior do que o esperado, o que levou a uma reavaliação do hiato para o campo positivo.

(3) Inflação e expectativas: Tom piora, e não há desinflação. IPCA e inflação subjacente acima da meta (o que é mudança na forma do Comitê colocar a questão, posto que já estamos assim há algum tempo…)

A desinflaçãoinflação medida pelo IPCA cheio tem arrefecido, enquantoassim como medidas de inflação subjacente se situaram acima da meta para a inflação nas divulgações mais recentes.

As expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 4,4%4,0 e 4,0%, respectivamente.

(4) Projeções condicionais: BCB muda novamente a forma de comunicar as projeções, o que tende a melhorar adiante. Projeção sobe no horizonte relevante, mesmo em cenário de juro médio mais elevado na largada. Ajuste parece adequado frente à nossa avaliação do que seria o modelo oficial – lembrando que, em nossa visão, ele é um tanto otimista.

A projeção de inflação do Copom para o primeiro trimestre de 2026, atual horizonte relevante de política monetária, situa-se em 3,5% no cenário de referência (Tabela 1).

Tabela 1: Comparativo dos cenários (atual vs. anterior)

As projeções de inflação do Copom para o primeiro trimestre de 2026* situam-se em 3,4% no cenário de referência e 3,2% em cenário alternativo, no qual a taxa Selic é mantida constante ao longo do horizonte relevante.**

* A comunicação da projeção para seis trimestres à frente, correspondendo ao primeiro trimestre de 2026, atual horizonte relevante de política monetária, está em consonância com a nova sistemática de meta para a inflação estabelecida pelo Decreto 12.079/2024 com vigência a partir de 1º de janeiro de 2025.

** Em seu cenário de referência, no qual a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de R$5,55/US$, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC), as projeções de inflação do Copom para os anos-calendário situam-se em 4,2% para 2024 e 3,6% para 2025. Nesse cenário, as projeções para a inflação de preços administrados são de 5,0% em 2024 e 4,0% em 2025. No cenário alternativo, no qual a taxa Selic é mantida constante ao longo do horizonte relevante, as projeções de inflação situam-se em 4,2% para 2024 e 3,4% para 2025. Em ambos os cenários, o preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro de 2024 e de 2025. O valor para o câmbio foi obtido pelo procedimento usual.

(5) Balanço de riscos e decisão: Balanço de risco se torna assimétrico para cima (altista para a inflação), com os mesmos riscos anteriormente reportados. Em nossa visão, a deterioração do hiato do produto se sobrepõe a uma descompressão do cenário internacional, com os outros fatores de risco razoavelmente estáveis desde o último COPOM. A piora do cenário demanda política monetária mais contracionista, e corrobora a unânime elevação dos juros.

O Comitê ressaltaavalia que, em seus há uma assimetria altista em seu balanço de riscos para os cenários prospectivos para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma desancoragem das expectativas de inflação por período mais prolongado; (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado; e (iii) uma conjunção de políticas econômicas externa e interna que tenham impacto inflacionário, por exemplo, por meio de uma taxa de câmbio persistentemente mais depreciada. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (ii) os impactos do aperto monetário sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado. O Comitê avalia que as conjunturas doméstica e internacional exigem ainda maior cautela na condução da política monetária. Em particular, os impactos inflacionários decorrentes dos movimentos das variáveis de mercado e das expectativas de inflação, caso esses se mostrem persistentes, corroboram a necessidade de maior vigilância.

O Comitê monitora com atenção como os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros. A percepção dos agentes econômicos sobre o cenário fiscal, junto com outros fatores, tem impactado os preços de ativos e as expectativas dos agentes. O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária.

O cenário, marcado por resiliência na atividade, pressões no mercado de trabalho, hiato do produto positivo, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas, demanda uma política monetária mais contracionista. Considerando a evolução do processo de desinflação, os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu manter, por unanimidade, elevar a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, para 10,75%50 a.a.., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

(6) Próximos passos: O Comitê deixa em aberto tanto o ritmo como a magnitude do ciclo de ajuste futuro. Das suas projeções condicionais, é possível argumentar que cortes de juros na segunda metade de 2025 estão fora de cogitação, e que há alguma assimetria altista para o cenário FOCUS – que vê pico da Selic em 11,50%a.a. até o primeiro trimestre do ano que vem, com os supracitados cortes posteriores.

A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, ampliação da desancoragem das expectativas de inflação e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária.

O Comitê, unanimemente, optou por manter a taxa de juros inalterada, destacando que o cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas demandam acompanhamento diligente e ainda maior cautela. Ressalta, ademais, que a política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno da meta. O Comitê se manterá vigilante e relembra que eventuais ritmo de ajustes futuros na taxa de juros e a magnitude total do ciclo ora iniciado serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerão da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Ailton de Aquino Santos, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Gabriel Muricca Galípolo, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Picchetti, Renato Dias de Brito Gomes e Rodrigo Alves Teixeira