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Brasil (2025): O equilíbrio macroeconômico por um fio

DESTAQUE BRCG | Cenário 2025

Brasil: O equilíbrio macroeconômico por um fio

Livio Ribeiro (livio.ribeiro@brcg.com.br)

21/02/2025

Bottom line: 2025 será um ano marcado por intensos desafios na gestão macroeconômica. Esperamos que a Selic atinja (até) 15,50%a.a. em meados do ano, e, mesmo com desaceleração do crescimento, vemos infração do regime de metas (ou seja, IPCA acima de 4,5%) até o final de 2026. O equilíbrio macroeconômico é cada vez mais tênue, e a taxa de câmbio flutuante parece ser a nossa última linha de defesa.

Como foi 2024: Acelerado, desequilibrado e crescentemente arriscado

O crescimento do PIB foi, pelo segundo ano consecutivo, bem superior ao esperado. A economia brasileira terá crescido em torno de 3,5% em 2024, resultado muito maior do que as nossas projeções ao início do ano passado, em torno de +1,5%. Ao contrário do ocorrido em 2023, quando também houve surpresa no PIB, derivada de fatores exógenos (como a agropecuária), o forte crescimento de 2024 derivou de substancial retomada nos setores secundário (especialmente indústria de transformação e construção civil) e terciário (serviços, destacando comércio e “outras atividades de serviços”), corroborando grandes expansões no consumo das famílias e nos investimentos.

A demanda doméstica cresceu em ritmo superior ao da oferta. Estimamos que a demanda doméstica tenha crescido por aproximadamente 5,0% em 2024, com a componente privada ainda mais forte. Com isso, a contribuição do setor externo foi bastante negativa em 2024, com uma enorme aceleração do crescimento das importações. Tal padrão é clássico na economia brasileira; eventos de expansão acelerada do PIB são financiados por acesso à poupança externa (ou seja, aumento da contribuição negativa do setor externo no PIB), refletindo a nossa baixa capacidade de crescimento sustentado pela poupança doméstica.

Lembremos que 2024 foi marcado pela tragédia climática no Rio Grande do Sul – e, se não soubéssemos disso, os dados não nos diriam que ocorreu um choque. O desastre climático gerou enorme custos econômicos e sociais, ainda que concentrados – tanto no tempo (meados do 2º trimestre) como regionalmente (no estado). Um amplo programa de estímulos, com iniciativas orçamentárias (com impacto primário ou não) e creditícias de pouco mais de R$ 150bi, logrou mais do que compensar o choque negativo. Um analista desavisado não seria capaz de observar, nos dados de alta frequência, qualquer efeito do choque a posteriori – o que só reforça como a atividade foi vigorosa em 2024.

Ao contrário do ocorrido em 2023, os segmentos crédito-intensivos tiveram forte desempenho, mesmo com taxas de juros relativamente elevadas. Setores como construção civil, indústria manufatureira e investimentos avançaram de forma relevante em 2024, a despeito da interrupção do ciclo de cortes da Selic em maio (piso de 10,50%a.a.), e, mais ainda, do aumento da restrição monetária a partir de setembro (até atingir um patamar de 12,25%a.a. em dezembro). Ainda que o juro médio praticado em 2024 tenha sido inferior ao de 2023 (aproximadamente 11,00%a.a., vs. 13,15%a.a. em 2023), outros fatores entraram em jogo para explicar o forte desempenho, não somente dos segmentos crédito-intensivos, mas de toda a economia.

O mercado de trabalho seguiu robusto, dando suporte à absorção doméstica. A taxa média de desemprego foi de 6,6% em 2024, novo mínimo histórico da série iniciada em 2012, com forte expansão da ocupação em meio a uma progressiva normalização da taxa de participação, ainda que esta permaneça levemente abaixo do patamar observado no pré-pandemia. Mais do que nos volumes, houve importante expansão da renda (real), seja medida pelos retornos obtidos na ocupação principal, seja medida pela massa salarial ampliada (abarcando a renda do trabalho e quaisquer transferências diretas aos trabalhadores). Desemprego em baixa e renda em alta deram suporte à absorção doméstica, sendo um dos fatores por trás da explosão do consumo e das importações.

É seguro dizer que o desempenho do mercado de trabalho foi “excessivo”. Mudanças na estrutura de oferta de trabalho no pós-pandemia (ocorridas em todo o mundo, não somente no Brasil) e os efeitos defasados da reforma trabalhista implementada durante a administração Temer tornam difícil mensurar a taxa neutra de desemprego no Brasil – ou seja, aquela na qual o fator trabalho estaria em pleno emprego. Isso posto, é senso comum que os valores observados durante 2024 (especialmente no segundo semestre, com a taxa de desemprego atingindo um mínimo histórico de 6,1% em novembro) colocaram a taxa de desemprego abaixo da taxa neutra. Seja nos volumes, seja nos preços, são abundantes as evidências de que o mercado de trabalho está excessivamente apertado.

O comportamento do crédito foi mais forte do que seria esperado, em princípio, pela instância monetária. A despeito de juros relativamente elevados, as concessões de crédito tiveram desempenho robusto durante a maior parte do ano, levando a um crescimento de +10,9% no estoque de crédito da economia (no Sistema Financeiro Nacional) em 2024 – um ritmo mais rápido que o +8,1% registrado em 2023. Houve mudança de perfil, com operações livres acelerando frente ao crédito direcionado e crescimento das taxas de expansão de operações destinadas tanto às pessoas físicas como às jurídicas. A aparente menor reação do crédito ao elevado patamar da Selic foi motivo de debate, com o próprio Banco Central postulando que isso estaria diretamente ligado à pujante atividade econômica e ao mercado de trabalho robusto. Importante notar que, ao final do ano, emergiram sinais tentativos de desaceleração, em meio ao aperto das condições financeiras (domésticas e externas).

A política fiscal seguiu expansionista, colocando pressão sobre o equilíbrio macroeconômico. Ainda que se tenha observado moderação frente ao ano anterior, 2024 também foi marcado por impulso fiscal, sendo mais um vetor a maximizar o crescimento econômico. É importante ter em mente que o próprio crescimento acelerado ajudou a aumentar o ritmo de crescimento das receitas (tributárias), o que, em paralelo a alguma moderação nos gastos, implicou em cumprimento da meta primária estabelecida no arcabouço fiscal (déficit de 0,1% do PIB). No entanto, ao contabilizarmos despesas primárias excluídas da meta, como o apoio (primário) ao Rio Grande do Sul, registrou-se déficit de -0,4% do PIB em 2024 – bastante melhor que o observado em 2023 (-2,3% do PIB) e do que a nossa projeção ao início do ano (-1,1% do PIB), mas, ainda assim, pressionando o endividamento público, que atingiu 76,1% do PIB na métrica bruta (DBGG) e 61,1% do PIB na métrica líquida (DLSP).

Tem se tornado cada vez mais difícil acompanhar o desempenho fiscal “efetivo”. Com despesas contabilizadas fora do arcabouço fiscal, elevações não-recorrentes nas receitas, critérios estatísticos diversos e uso crescente de fundos públicos para implementar gastos extraorçamentários (política parafiscal, com estimativas de 0,3 p.p. do PIB em 2025[1]), é cada vez mais difícil extrair a real contribuição do impulso fiscal ao desempenho da economia – mas é evidente que o ímpeto expansionista é (bem) maior do que aquele que emerge de uma leitura inicial dos dados.

A expansão acelerada da economia doméstica reduziu o saldo comercial. O superávit comercial caiu US$ 25bi no ano passado, encerrando 2024 em US$ 74,6bi. As menores vendas líquidas ao exterior ocorreram devido a um crescimento das importações, combinando não somente a forte aceleração da absorção doméstica a uma normalização das compras externas em setores “comprimidos” durante 2023, especialmente os combustíveis. Importante notar que isso ocorreu a despeito de uma forte depreciação da taxa de câmbio (aproximadamente 27% em 2024), o que, por si, deveria ter ajudado na manutenção de saldos comerciais mais robustos.

Depois de muito tempo, foi necessário voltar a falar de “desequilíbrio” externo. Com saldo comercial menor e manutenção de grandes saídas líquidas em serviços e rendas, o déficit em conta corrente aumentou 1,5p.p. do PIB em 2024, atingindo 2,6% do PIB (US$ 56,0bi). Mais importante, as fontes de financiamento externo não foram suficientes no ano, levando a uma redução dos ativos de reserva brasileiros em US$ 26,4bi – destacando um péssimo desempenho em dezembro, em meio a uma crise de confiança e rápido desmonte da posição de estrangeiros em ativos locais. Não falamos de uma crise no balanço de pagamentos, que tanto nos assombrou no passado, mas a nossa confortável situação externa começou a mudar – e, com um mundo mais “complicado”, parece seguro dizer que a margem de manobra se tornou menor.

Em ambiente desafiador, a taxa de câmbio terminou o ano em R$ 6,18/US$. A depreciação cambial de 27,2%, saindo de R$ 4,86/US$ ao final de 2023, ocorreu, segundo nossos modelos, primordialmente devido a fatores domésticos – em contraposição ao resultado usual, que sugere uma importância sensivelmente maior de fatores globais. É difícil não associar isso a grandes ruídos de comunicação e atuação do Executivo, como os reiterados ataques à gestão do Banco Central e o desastrado anúncio de um pacote de ajuste fiscal em paralelo à confirmação, com efeitos para 2026 (ano eleitoral), da mudança na tabela de isenção do Imposto de Renda. Ao final do ano, em meio a uma grande crise de confiança no governo, a moeda sofreu intensa pressão, que, para muitos, foi excessiva – abrindo, pelo menos, uma base mais favorável para o comportamento da moeda na virada do ano.

Os múltiplos desequilíbrios da economia desaguaram na inflação. A variação dos preços, medida pelo IPCA, encerrou 2024 em +4,83%, bastante acima do nosso cenário de início de ano (+3,9%), configurando mais uma infração do regime de metas de inflação – ou seja, variação dos preços fora do limite de tolerância da meta (3,0% +/-1,5%). Em comparação a 2023, a composição da inflação mostrou importante aceleração dos preços livres (+4,9% vs. +3,1%), com leituras mais elevadas em bens (+2,9%), especialmente em tradables (+6,0%), além de manutenção de elevadas pressões tanto em non-tradables (+4,1%) como em serviços (+4,8%). A situação só não foi pior devido a uma importante descompressão dos preços administrados (+4,7% vs. +9,1%), em muito ajudada por uma melhora do regime hídrico e certo represamento dos preços de combustíveis (mesmo considerando o reajuste feito no início do ano).

Foram evidentes os sinais de espalhamento da inflação ao longo do ano. Questões exógenas tiveram importância para o resultado do IPCA em 2024, tais como a aceleração dos preços de alimentos, mas é difícil não associar a maior inflação ao excesso de demanda, e, em menor medida, à depreciação cambial. Em específico, houve evidente dificuldade para uma redução consistente da inflação de serviços, e as métricas subjacentes apresentaram sólida elevação, afastando-se da meta. 2024 deixou uma herança maldita para 2025.

Com piora do cenário inflacionário e evidências de uma economia sobreaquecida, o Banco Central foi obrigado a reverter a direção do ciclo monetário. Sempre expressamos o nosso desconforto com o corte de juros iniciado em meados de 2023, por não vermos condições suficientes para o cumprimento da meta de inflação no horizonte relevante. A despeito de projeções condicionais e expectativas de inflação crescentes, a autoridade monetária seguiu reduzindo a taxa Selic até a reunião do COPOM de maio, quando atingiu 10,50%a.a. Em um par de meses, no entanto, o Banco Central se viu forçado a retomar a elevação dos juros. E, com rápida piora do cenário, tanto corrente como esperado, 2024 terminou com Selic a 12,25%a.a. e forward guidance para uma taxa de, ao menos, 14,25%a.a. até o final do 1º trimestre de 2025.

A gestão monetária foi marcada por grandes ruídos e problemas de comunicação, ampliando as dúvidas sobre a atuação futura do Comitê. Foi sintomático o ocorrido na reunião de maio, na qual os diretores escolhidos pelo atual Executivo (incluindo o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo) votaram por um corte mais agressivo (-50bps) da Selic, ao passo em que o grupo vencedor, com diretores escolhidos pelo Executivo anterior (incluindo o presidente Campos Neto, com mandato terminando ao final do ano), votou por uma redução mais lenta da taxa Selic (-25bps). O evento ampliou os temores de captura política sob a presidência de Galípolo (a partir de 2025), aumentando a volatilidade e as dúvidas sobre a atuação monetária.

Patologias passaram a ser abertamente discutidas. Como esperávamos, a falta de coordenação entre as políticas fiscal e monetária deu o tom de 2024. Quando da elevação da taxa Selic, a partir de setembro, e principalmente com a subsequente aceleração do ritmo de ajuste, tanto em novembro (+50bps) como em dezembro (+100bps e guidance para mais dois movimentos subsequentes, de mesma magnitude), analistas passaram a discutir quais seriam os limites impostos, à política monetária, por uma política fiscal inconsistente e insustentável. O tema de dominância fiscal voltou a assombrar o mercado, em meio a expectativas de inflação desancoradas e a uma estrutura a termo da taxa de juros altamente volátil.

O cenário externo não ajudou ao final do ano, gerando uma “tempestade perfeita”. Após a eleição de Donald Trump nos EUA, construiu-se um entendimento de que o ambiente internacional se esgarçaria, levando a um ciclo de aumento da percepção de risco, fortalecimento do dólar americano e maior incerteza. A piora dos ventos externos atingiu o Brasil em momento de grande fragilidade, gerada por nossas agruras domésticas, amplificando as já relevantes incertezas e criando uma “tempestade perfeita” nos ativos financeiros locais. Sem parâmetro, a taxa de câmbio, as taxas de juros e as expectativas de inflação (especialmente as medidas a mercado, como na inflação implícita) explodiram ao final de 2024.

O que esperamos de 2025: O equilíbrio macroeconômico por um fio

Esperamos uma desaceleração do crescimento do PIB para +1,7%, com diferentes velocidades entre PIB cíclico e não-cíclico. Ao final de 2024, começaram a emergir sinais, nos dados de alta frequência, de uma desaceleração mais pronunciada da atividade, o que se alinha à nossa visão de redução do ímpeto da economia em 2025. Condições financeiras mais restritivas, um cenário global mais desafiador e uma redução do impulso fiscal estão na raiz do menor crescimento econômico. Importante ter em vista que o crescimento de 2025 será ajudado por fatores exógenos (não-cíclicos), especialmente na agropecuária. O desempenho do PIB cíclico (em última instância, a parcela sensível aos ciclos de políticas públicas) será menor, o que ficará especialmente marcado na segunda metade do ano.

Há riscos relevantes para esse cenário. Do lado externo, existe enorme incerteza em função das mudanças do equilíbrio geopolítico e econômico global, com implicações e reverberações que a ainda estão longe de serem compreendidas. Do lado doméstico, há dúvida genuína sobre a taxa de sacrifício que será suportada pelo Executivo, ou seja, o quanto o governo, já mirando a dinâmica eleitoral de 2026, deixará a economia desacelerar. Foco, nesse sentido, em iniciativas fiscais e monetárias, que tendem a ter mais um ano de volatilidade e bruscas mudanças de direção.

O desempenho da política fiscal é uma grande dúvida em 2025, especialmente quanto mais próximo estivermos do fim do ano. No cenário-base, o déficit primário será aproximadamente igual ao observado em 2024. Há, no entanto, temores crescentes de utilização de estratégias parafiscais para impulsionar a economia, mesmo que sem impacto primário. A própria mudança na tabela de isenção do Imposto de Renda, com efeito para 2026, se enquadra nessa categoria: mesmo que seja fiscalmente neutra (supondo o pleno sucesso de medidas compensatórias, de escopo ainda incerto), ela não será macroeconomicamente neutra, impactando o desempenho da demanda agregada ao liberar renda em uma parcela da população mais propensa ao consumo. Tal como em 2024, será bastante difícil medir o impulso fiscal efetivo.

O ciclo eleitoral já começou, e o cenário é muito mais aberto do que alguns analistas defendem. No início de 2025, aumentaram as apostas de uma mudança de governo em 2026, o que consideramos extremamente prematuro. De um lado, é fato que com a aceleração da inflação e diversos problemas na comunicação com a sociedade, as taxas de aprovação do presidente Lula despencaram, tornando a tarefa de recondução (do próprio, ou de seu grupo político) mais difícil. De outro lado, denúncia da PGR abriu espaço para a condenação do ex-presidente Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado, automaticamente tornando-o inelegível para o próximo pleito presidencial. Tanto à esquerda quanto à direita, a situação se encontra em aberto para 2026. Isso trará ruídos e gerará pressão sobre políticas públicas, especialmente se a desaceleração do crescimento econômico se mostrar mais intensa no decorrer do ano.

O desempenho do mercado de trabalho é um tema importante. Sabemos que a taxa de desemprego reage de forma defasada ao ciclo econômico, de forma que uma desaceleração da atividade tenderá a ter impactos mais perceptíveis sobre as condições de emprego e renda a partir da segunda metade de 2025. Ainda assim, esperamos que a taxa média de desemprego seja de somente 6,8% no ano, levemente acima do ocorrido em 2024. O aumento da carestia é tema central, pois reduz a percepção de bem-estar, o que se alinha à evolução da popularidade presidencial, à probabilidade de recondução do Executivo ao poder em 2026 e à possibilidade de grandes mudanças nas políticas públicas se este projeto estiver sob risco.

A taxa de câmbio seguirá pressionada, apesar do bom desempenho no início de 2025. Nas primeiras semanas do ano, a cotação da moeda recuou aproximadamente 50 centavos, atingindo R$ 5,70/US$. Segundo os nossos modelos, o movimento foi estritamente devido a eventos externos, destacando um enfraquecimento do dólar no mundo e um aumento dos preços de commodities, com a interpretação de que as mudanças implementadas sob Trump foram, ao menos na largada, menos intensas do que o esperado. Entendemos que essa melhora não está bem alicerçada, de forma que a pressão sobre a moeda seguirá sendo relevante no ano. No cenário-base, esperamos uma cotação em torno de R$ 6,00/US$ em 2025; cenários alternativos, positivo e negativo, colocam a cotação da moeda em, respectivamente, R$ 5,50/US$ e R$ 6,80/US$.

A inflação deve acelerar para 6,2% em 2025, aumentando as dúvidas quanto à efetiva manutenção do regime de metas de inflação. Na virada do ano, alguns riscos negativos se materializaram, tanto em preços livres (principalmente alimentação e serviços) como em preços administrados (combustíveis). Com arrasto de um excesso de demanda, condições financeiras (ainda) não suficientemente restritivas e riscos prospectivos relevantes, a inflação deve permanecer acima do limite de tolerância do regime de metas durante todo o ano. Note-se que esse também é o cenário oficial, ainda que o Banco Central espere uma inflação mais baixa de acordo com os seus modelos (5,2%).

É importante entender como a autoridade monetária se comportará, com um regime de metas de inflação contínuo. Sob o regime contínuo, a inflação anual pode ficar acima do limite superior da banda por seis meses consecutivos, antes de se definir a infração do regime. Segundo o próprio Banco Central, isso ocorrerá em julho, não havendo convergência à banda, pelo menos, até o 1º trimestre de 2026. No horizonte relevante para a política monetária (18 meses à frente), a projeção oficial é de um IPCA de 4,0% – dentro da banda de tolerância, mas fora da meta de inflação de 3,0%. Em letra fria, isso indicaria que os juros utilizados nas projeções oficiais (15,00%a.a. a partir de meados de 2025, com cortes somente em 2026) são insuficientes, colocando um viés de alta ainda relevante para a taxa Selic. Mas temos dúvidas quanto a isso.

A despeito dos óbvios desafios e riscos ao regime de metas de inflação, esperamos que a Selic atinja, no máximo, o patamar de 15,50%a.a. E isso não será suficiente. Partindo de um patamar de IPCA mais elevado em 2025 (6,2%, como já exposto), entendemos que esse nível de juros, mantido até o final de 2026, conseguirá reduzir o IPCA somente para 5,3% até o final de 2026. Ou seja, o regime de metas de inflação contínuo não será, em termos práticos, respeitado. Temos dúvidas, inclusive, se a autoridade monetária estará disposta a atingir o patamar de juros que esperamos, posto que, em seus modelos, um Selic levemente inferior (15,00%a.a.) não leva a uma infração do regime (IPCA projetado dentro da banda de tolerância).

O equilíbrio macroeconômico está por um fio. Com dificuldades claras na consolidação fiscal necessária à estabilização da dívida pública e com uma interpretação cada vez mais “permissiva” do regime de metas de inflação, o equilíbrio macroeconômico se encontra ameaçado. A última linha de defesa parece estar na manutenção de um regime de câmbio flutuante, o que, ao menos por enquanto, não vemos sob risco. Como corolário, é na cotação da moeda que devemos ter os maiores ajustes, em caso de piora adicional do cenário macroeconômico brasileiro.

DISCLAIMER

Este relatório foi produzido pela BRCG utilizando dados públicos compilados até 21 de fevereiro de 2025 e possui caráter meramente informativo. O relatório é destinado a clientes e investidores institucionais, não podendo a BRCG e/ou os seus analistas serem responsabilizados por quaisquer perdas, diretas ou indiretas, derivadas de sua utilização. Este relatório não pode ser reproduzido, distribuído ou publicado por qualquer pessoa ou instituição, para quaisquer fins, sem a estrita autorização da BRCG.

[1] Ver: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcos-mendes/2025/01/autopsia-do-deficit-primario-de-2024.shtml e https://macroattachment.cloud.itau.com.br/attachments/d6a018cb-09e6-4937-89da-7c74642291c3/23012025_MACRO_VISAO_As_Perguntas_Fiscais_Fundamentais_2025.pdf