03/08/2022
Bottom line: O Banco Central elevou a taxa Selic em 50bps na reunião de agosto, levando-a a 13,75%a.a. Há soluções de compromisso que nos parecem sensatas, reconhecendo as distorções geradas por iniciativas “não-monetárias” no biênio 2022-2023 e a necessidade de alongar, progressivamente, o horizonte de convergência inflacionária. O Comitê analisará a conveniência de um ajuste residual de 25bps em setembro, movimento alinhado ao nosso call de Selic terminal de 14,00%a.a. em 2022. Enxergamos uma potência da política monetária menor do que a extraída dos modelos oficiais; com isso, esperamos que a Selic seja mantida em 14,00%a.a. até, pelo menos, o final de 2023, com vistas à convergência da inflação, para o redor da meta, ao final de 2024.
O Banco Central elevou a taxa Selic em 50bps na reunião de agosto, referendando as expectativas de mercado e a nossa visão expressa em comentário prévio à reunião, levando a taxa de juros a 13,75%a.a. O Copom sinaliza que avaliará a conveniência de um ajuste residual, de menor magnitude, na reunião de setembro – alinhando-se, portanto, ao nosso cenário de Selic terminal de 14,00%a.a., a ser atingida na reunião de set/22.
Como esperávamos, o Banco Central passou a incorporar, em menor grau, o ano de 2024 como parte do seu horizonte relevante – e, nele, a inflação projetada segue abaixo da meta (em 2,7%), ainda que, em comparação ao observado em junho, seja necessário utilizar níveis médios, e terminais, mais elevado de juros – em 2022 (13,75% vs. 13,25%), em 2023 (11,00% vs. 10,00%) e em 2024 (8,00% vs. 7,50%). Mais ainda, as recentes medidas não-monetárias incidentes sobre os preços administrados foram incorporadas ao cenário oficial, levando a uma revisão de -830bps na inflação de administrados em 2022 e de +210bps em 2023. Traduzindo isto para impactos no IPCA, vemos efeitos pouco superiores a -200bps neste ano (totalmente alinhado ao nosso cenário) e de +50bps em 2023 (1/3 do que esperamos em nosso cenário-base, mas reconhecendo que há hipóteses envolvidas de difícil avaliação).
A inflação de preços livres que emana dos modelos oficiais segue, no geral, mais benigna do que a que extraímos de nossos modelos, mesmo que os desvios agora sejam menores. A grande diferença está, de fato, no biênio 2023-2024, para qual temos juros mais elevados (a taxa Selic permanece em 14,00%a.a. até o 2024.T1) e inflações mais elevadas: 6,1% em 2023 (em muito devido à hipótese de administrados) e 3,3% em 2024 (com inflação de preços livres claramente superior à oficial).
Fomos positivamente surpreendidos por duas escolhas de comunicação da autoridade monetária, que demonstram uma solução de compromisso que nos parece minimamente sensata. Em primeiro lugar, ao reconhecer as distorções do biênio 2022-2023, o Copom criou um “ponto de análise” no início de 2024, horizonte que seria menos afetado, diretamente, pelas distorções implementadas, mas que carregaria os seus efeitos através de impactos secundários na estrutura de preços da economia. Com uma inflação projetada de 3,5% neste horizonte, o Copom sinaliza que ajustes adicionais ainda precisam ser feitos, mesmo que, em sua visão, sejam moderados.
Em segundo lugar, não esperávamos que o Copom fornecesse qualquer tipo de pista sobre a sua decisão de setembro – deixando claro, no entanto, que sempre vimos que um ajuste adicional da Selic seria necessário e recomendável, mesmo que os objetivos operacionais (convergência para o redor da meta ao longo do horizonte relevante) sejam excessivamente genéricos. Ainda que o Comitê não tenha se comprometido, ele sinalizou, de forma clara, que analisará a necessidade de um ajuste residual de 25bps na próxima reunião – em linha, portanto, com o cenário que temos defendido há muito tempo.
O Comitê segue mais confiante na potência de sua atuação e nos efeitos defasados dos ajustes implementados do que achamos recomendável, mas os desvios de cenário parecem ser, genuinamente, menores do que nas atualizações anteriores. Um ajuste adicional dos juros e um progressivo alongamento do prazo (crível) de convergência são bem-vindos. Restam diferenças na avaliação prospectiva, mas muito se deve a hipóteses (em 2023) e à construção dos modelos analíticos (afetando todo o horizonte discutido, mas, crescentemente, de 2023 em diante).
Isso posto, reafirmamos o nosso call de Selic terminal a 14,00%a.a. em 2022, sendo atingida na próxima reunião com um movimento residual de 25bps. A convergência para o redor da meta de 2023 é impossível, e isso está cristalino no cenário oficial. Entendemos que será necessário um juro médio bem mais elevado, em 2023, do que o presente nos modelos oficiais, para garantir a convergência da inflação para números ao redor de 3,0% ao final de 2024; com Selic estável até, pelo menos, o final de 2023, vemos o IPCA encerrando 2024 em 3,3%.
Mais detalhes seguem abaixo. Como sempre, texto anterior em vermelho e novo texto sublinhado, com grifos onde julgamos relevante.
(1) Cenário externo: Ambiente externo adverso, com crescimento caindo, inflação ainda acelerada e aumento dos juros em ritmo mais intenso. Volatilidade é a palavra que dá o tom do cenário e dos preços de ativos
O ambiente externo seguiu mantém-se deteriorando, marcado poradverso e volátil, com maiores revisões negativas para o crescimento global prospectivo em um ambiente inflacionário ainda pressionado. O processo de fortes e persistentes pressões inflacionárias. O aperto das condições financeiras motivado pela reprecificaçãonormalização da política monetária nos países avançados, assim como pelo aumento da aversão tem se acelerado, impactando o cenário prospectivo e elevando a risco, eleva a incerteza e gera volatilidade adicional, particularmente nos países emergentesdos ativos
(2) Atividade doméstica: Cenário seguiu benigno durante o 2o trimestre, destacando uma retomada mais intensa do mercado de trabalho
Em relação à atividade econômica brasileira, o conjunto dos indicadores divulgado desde a última reunião do Copom indica umseguiu indicando crescimento acimaao longo do segundo trimestre, com uma retomada no mercado de trabalho mais forte do que era esperadoesperada pelo Comitê
(3) Inflação e expectativas: Inflação segue elevada, difusa e com expectativas desancoradas
A inflação ao consumidor seguiu surpreendendo negativamentecontinua elevada, tanto em componentes mais voláteis como em itens associados à inflação subjacente
As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação
As expectativas de inflação para 2022, 2023 e 2024 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 8,5,7,2%, 5,3%, 4,7% e 3,3%3,25%, respectivamente
(4) Projeções condicionais: O Comitê incorpora os efeitos esperados das medidas “não-monetárias” incidentes nos preços administrados, reduzindo a inflação de administrados por -830bps em 2022 (impacto aproximado de -210bps no IPCA) e aumentando a pressão em 2023 por +210bps (aproximadamente +50bps no IPCA). Há outros choques envolvidos e premissas que não controlamos (por exemplo, preços em combustíveis em reais), mas, em linhas gerais, o choque de 2022 parece alinhado ao de nosso cenário, mas o de 2023 é sensivelmente menor. Com uma Selic terminal de 13,75%a.a. em 2022, 11,00%a.a. em 2023 e 8,00%a.a. em 2024, as projeções de curto prazo seguem fora das metas (6,8% em 2022 e 4,6% em 2023), mas continua-se enxergando inflação de 2,7% em 2024. O cenário oficial nos parece mais equilibrado nesta avaliação, com pequena diferença em relação ao IPCA que projetamos para 2022 (7,0%), e, controlando para diferentes hipóteses de recomposição tributária, também para 2023 (6,1%, mas com 150bps de efeito, no IPCA, de aumentos de impostos). Com premissas e dinâmicas distintas, e mesmo com uma taxa Selic que atinge 14,00%a.a. em set/22 e lá fica até o início de 2024, ainda vemos IPCA de 3,3% ao final de 2024. É importante notar que o Comitê inovou ao discutir a projeção de inflação em um ponto intermediário (2024.T1), tentando controlar para os efeitos da torção em administrados do biênio 2022-2023 – é uma “solução de compromisso”, que achamos inteligente. A inflação projetada de 3,5% neste horizonte de tempo nos parece benigna, ainda que não seja inconsistente com o cenário traçado pelo BCB.
No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de USD/BRL 4,905,30*, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). Esse cenário supõe trajetória de juros que termina 2022 em 13,75%13,25% a.a., reduz-se para 10,011,00% em 2023 e 7,508,00% em 2024. Optou-se por manter a premissa deSupõe-se que o preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses, terminando o ano em US$110/barril, e passa a aumentar 2% ao ano a partir de janeiro de 2023posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “amarela” em dezembro de 2022, de 2023 e de 2024. Nesse cenário, as projeções de inflação do Copom situam-se em 8,8%6,8% para 2022, 4,6%4,0% para 2023 e 2,7% para 2024. As projeções para a inflação de preços administrados são de 7,0% -1,3% para 2022, 6,3%8,4% para 2023 e 3,6%3,3% para 2024. As projeções do cenário de referência não incorporam o impacto das medidas tributárias sobre preçosrecentemente aprovadas. Para o horizonte de combustíveis, energia elétrica e telecomunicaçõesseis trimestres à frente, que estãosuaviza o efeito ano-calendário, mas incorpora os impactos secundários das medidas tributárias que incidem entre 2022 e o primeiro trimestre de 2023, a projeção de inflação acumulada em tramitação.doze meses situa-se em 3,5%. O Comitê julga que a incerteza em torno das suas premissas e projeções atualmente é maior do que o usual e cresceu desde a última reunião
(5) Balanço de riscos e decisão: Confirmando o que esperávamos, o Comitê não ressuscitou a assimetria altista para o balanço de riscos inflacionário. Reconheceu, no entanto, uma maior amplitude de cenários, contrapondo, explicitamente, a possibilidade de estímulos mais permanentes à demanda doméstica (negativos para a inflação) e o aumento do risco de desaceleração da economia global (positivo para a inflação). Além disso, há uma clara tentativa de olhar um pouco além do biênio 2022-2023, muito distorcido por medidas “não-monetárias”; o 2024.T1 já seria um horizonte livre de distorções, mas carregando os efeitos secundários dos choques sobre as projeções de inflação. Tendo isso em mente, a Selic sobe 50bps, já olhando, em menor grau, para 2024 – o que julgamos ser muito mais realista e ponderado do que insistir em uma convergência impossível (em 2023). A convergência para o redor da meta ao longo do horizonte relevante segue sendo um objetivo operacional excessivo genérico.
O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; e (ii) a incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do país e políticasestímulos fiscais adicionais que impliquem sustentação da demanda agregada, parcialmente incorporadasincorporados nas expectativas de inflação e nos preços de ativos. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento nos preços das commodities internacionais em moeda local; e (ii) uma desaceleração da atividade econômica mais acentuada do que a projetada. Avaliou-se que as medidas tributárias em tramitação reduzem sensivelmente a inflação no ano corrente, embora elevem, em menor magnitude, a inflação no horizonte relevante de política monetária. O Comitê avalia que a conjunturaO Comitê pondera que a possibilidade de que medidas fiscais de estímulo à demanda se tornem permanentes acentua os riscos de alta para o cenário inflacionário. Por outro lado, nota que o aumento do risco de desaceleração da economia global também acentua os riscos de baixa. O Comitê avalia que a conjuntura ainda particularmente incerta e volátil requer serenidade na avaliação dos riscos
Notou-se que as projeções de inflação para os anos de 2022 e 2023 estavam sujeitas a impactos elevados associados às alterações tributárias entre anos-calendário. Assim, o Comitê optou neste momento por dar ênfase à inflação acumulada em doze meses no primeiro trimestre de 2024, que reflete o horizonte relevante, suaviza os efeitos diretos decorrentes das mudanças tributárias, mas incorpora seus impactos secundários sobre as projeções de inflação relevantes para a decisão de política monetária
Considerando os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa básica de juros em 0,50 ponto percentual, para 13,75%13,25%a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete a incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos com variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva, e é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano-calendário de 2023 e, em grau menor, o de 2024. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
(6) Próximos passos: Confirmando, em parte, a nossa expectativa, o Comitê não se comprometeu com um movimento na sua próxima reunião. Esperávamos, no entanto, que o Copom não fizesse qualquer menção à decisão de setembro, mas não foi isso que ocorreu. Haverá uma avaliação da necessidade de ajuste residual de 25bps na próxima reunião, e temos convicção de que, com o conjunto de informação atual, tal ajuste será necessário. A atuação oficial alinha-se, portanto, ao nosso cenário de Selic terminal a 14,00%a.a., a ser atingida em set/22 – nível de juros que, se mantido até o início de 2024, permitirá a convergência para o redor da meta ao fim daquele ano.
O Copom considera que, diante de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário continue avançando significativamente em território ainda mais contracionista. O Comitê enfatiza que irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas.