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Decisão de política monetária – Comunicado do Copom (set/22): Manutenção dividida

22/09/2022

Bottom line: O Banco Central manteve a taxa de juros em 13,75%a.a. na sua reunião de setembro, em linha com a visão hegemônica do mercado e sem implementar o nosso call de ajuste residual. A escolha pela manutenção ou elevação dos juros era cercada de subjetividade, não havendo, a priori, decisão certa ou errada; não foi por acaso que dois diretores votaram por um ajuste adicional de 25bps. O debate agora migra para a manutenção dos juros por período suficientemente prolongado, como forma de promover a convergência inflacionária. Se o Banco Central tem por objetivo reduzir o orçamento de cortes precificado para o primeiro semestre de 2023, a sua comunicação precisa ser muito mais dura. Reafirmamos o nosso call de manutenção da taxa Selic em 13,75%a.a. até o final de 2023, com vistas à convergência da inflação para a meta de 2024.

O Banco Central manteve a taxa Selic em 13,75%a.a. na reunião de setembro, em linha com a visão hegemônica do mercado e diferente de nosso call de uma elevação residual de 25bps na taxa básica. Como exposto em relatório enviado previamente à reunião, a lógica da elevação residual não era numérica; a diferença de juros pouco mudaria a inflação projetada no horizonte relevante. O argumento passava pela sinalização de maior vigilância e prudência, em cenário de elevada incerteza prospectiva (especialmente na coordenação entre as políticas fiscal e monetária), de expectativas de inflação acima das metas no horizonte relevante e de revisões para cima no crescimento de curto prazo. Nesse sentido, a escolha pela manutenção ou elevação residual era cercada de subjetividade, não havendo, a priori, decisão certa ou errada. Não foi por acaso que a decisão foi dividida, com dois diretores votando pelo ajuste residual.

Em termos de cenário, não houve grandes mudanças em relação ao exposto no Comunicado anterior. Seguimos enxergando uma inflação de preços livres maior do que a implícita nos modelos oficiais, ainda que os desvios pareçam ser relativamente pequenos para 2022 e 2023. Inclusive, as nossas projeções para o IPCA estão bastante próximas às do Banco Central neste horizonte (ambas em 5,8% para 2022 e, respectivamente, de 4,5% e 4,6% para 2023), mesmo que com hipóteses de preços administrados levemente distintas (no nosso modelo, queda mais pronunciada em 2022 e elevação menos intensa em 2023, implicando em inflação de preços livres mais elevada). 

A grande diferença parece emergir para 2024, quando, em cenário de manutenção dos juros em 13,75%a.a. até o fim do ano que vem, projetamos IPCA de 3,4%. Sabemos que o cenário oficial incorpora cortes de juros a partir de 2023, mesmo que os juros utilizados no cenário de referência não tenham sido explicitados neste Comunicado. A inflação projetada pelo Banco Central segue levemente abaixo da meta em 2024, em 2,8%. O Comitê segue mais confiante na potência de sua atuação e nos efeitos defasados dos ajustes implementados do que achamos recomendável, mas os desvios de cenário parecem ser, genuinamente, relativamente contidos

Em conclusão, o debate agora migra para a manutenção dos juros por período suficientemente prolongado, como forma de promover a convergência inflacionária desejada pela autoridade monetária. O cenário de mercado continua embutindo cortes de juros mais intensos e mais rápidos do que nos parece razoável, dada toda a incerteza prospectiva envolvida – e aqui estamos falando, explicitamente, da interação entre as políticas monetária e fiscal no próximo governo. 

Assim sendo, se o Banco Central tem por objetivo reduzir o orçamento de cortes precificado para o primeiro semestre de 2023, a sua comunicação precisa ser muito mais dura do que a atual; simplesmente falar que o ciclo de elevação dos juros pode ser retomado se a inflação não convergir nos parece insuficiente. Reafirmamos o nosso call de manutenção da taxa Selic em 13,75%a.a. até o final de 2023, com vistas à convergência da inflação para a meta de 2024. Definidos os parâmetros do arcabouço fiscal do próximo governo, poderemos revisar o nosso call.

Mais detalhes seguem abaixo. Como sempre, texto anterior em vermelho e novo texto sublinhado, com grifos onde julgamos relevante.

(1) Cenário externo: Ambiente externo segue adverso, dando mais foco à desaceleração chinesa. Ajuste da política monetária global segue a terreno restritivo.

O ambiente externo mantém-se adverso e volátil, com maiorescontínuas revisões negativas para o crescimento globaldas principais economias, em um especial para a China. O ambiente inflacionário aindasegue pressionado. O, enquanto o processo de normalização da política monetária nos países avançados tem se acelerado, impactando o cenário prospectivo e elevando a volatilidade dos ativosprossegue na direção de taxas restritivas

(2) Atividade doméstica: PIB acima do esperado no 2o trimestre, com tom positivo para os indicadores subsequentes.

Em relação à atividade econômica brasileira, a divulgação do PIB apontou ritmo de crescimento acima do esperado no segundo trimestre, e o conjunto dos indicadores divulgado desde a última reunião do Copom seguiu indicando crescimento ao longo do segundo trimestre, com uma retomada no mercado de trabalho mais forte do que era esperada pelo Comitêsinalizando crescimento

(3) Inflação e expectativas: Inflação segue elevada, a despeito de queda nos itens mais voláteis e dos efeitos das medidas tributárias em vigor. Expectativas de inflação recuaram no biênio 2022-2023, mas subiram levemente em 2024.

A inflação ao consumidor, apesar da queda recente em itens mais voláteis e dos efeitos de medidas tributárias, continua elevada, tanto em componentes mais voláteis como em itens associados à inflação subjacente

As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação

As expectativas de inflação para 2022, 2023 e 2024 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 7,26,0%, 5,0%5,3% e 3,5%3,3%, respectivamente

(4) Projeções condicionais: O Comitê novamente não explicitou, no comunicado, a trajetória de Selic utilizada em seu cenário de referência – o que certamente ocorrerá na ata. Em dito isso, a inflação projetada reduziu em 2022, manteve-se em 2023 e oscilou, para cima, em 2024. A projeção do “ponto de análise” no 2024.T1 seguiu em 3,5%. Em termos de inflação projetada, o cenário é equivalente ao nosso para o biênio 2022-2023, anos para os quais temos projeções de, respectivamente, 5,8% e 4,5%. Há diferença nas premissas de administrados, com queda um pouco mais intensa em 2022 (-4,5%) e elevação menos intensa em 2023 (7,8%). Resulta, assim, que continuamos enxergando uma inflação de preços livres maior do que a estimada pelo Banco Central. Mantendo as taxas de juros em 13,75%a.a. até o final de 2023, enxergamos um IPCA de 3,4% em 2024. Novamente, a diferença parece emergir de uma projeção mais elevada de inflação nos preços livres.

No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de USD/BRL 5,3020*, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). Esse cenário supõe trajetória de juros que termina 2022 em 13,75% a.a., reduz-se para 11,00% em 2023 e 8,00% em 2024. Supõe-se que oO preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro de 2022 e “amarela” em dezembro de 2022, de 2023 e de 2024. Nesse cenário, as projeções de inflação do Copom situam-se em 6,8%5,8% para 2022, 4,6% para 2023 e 2,8%2,7% para 2024. As projeções para a inflação de preços administrados são de 1,3%,-4,0% para 2022, 9,3% para 2022, 8,4% para 2023 e 3,6% para 2024. As projeções do cenário de referência incorporam o impacto das medidas tributárias recentemente aprovadas. Para o3,73,7% para 2024. O Comitê optou novamente por dar ênfase ao horizonte de seis trimestres à frente, que reflete o horizonte relevante, suaviza o efeito ano-calendárioos efeitos diretos decorrentes das mudanças tributárias, mas incorpora os seus impactos secundários das medidas tributárias que incidem entre 2022 e o. Nesse horizonte, referente ao primeiro trimestre de 20232024, a projeção de inflação acumulada em doze meses situa-se em 3,5%. O Comitê julga que a incerteza em torno das suas premissas e projeções atualmente é maior do que o usual.

(5) Balanço de riscos e decisão: O balanço de riscos fica numericamente maior. Do lado altista para a inflação, adiciona-se a possibilidade do hiato do produto ser menor do que o utilizado pelo BCB; do lado baixista, a possibilidade da reoneração tributária prevista para 2023 não ocorrer. Note-se que ambos os fatores têm se mostrado, ao menos em parte, cada vez mais prováveis. Mantendo a simetria dos riscos, o BCB decidiu manter a taxa Selic em 13,75%a.a., em decisão dividida.

O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; (ii) a incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do país e estímulos fiscais adicionais que impliquem sustentação da demanda agregada, parcialmente incorporados nas expectativas de inflação e nos preços de ativos.; e (iii) um hiato do produto mais estreito que o utilizado atualmente pelo Comitê em seu cenário de referência, em particular no mercado de trabalho. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento nosqueda adicional dos preços das commodities internacionais em moeda local; (ii) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada. O Comitê pondera que; e (iii) a possibilidade de que medidas fiscais de estímulo à demanda se tornem permanentes acentua os riscosmanutenção dos cortes de altaimpostos projetados para o cenário inflacionário. Por outro lado, nota que o aumento do risco de desaceleração da economia global também acentua os riscos de baixa.serem revertidos em 2023. O Comitê avalia que a conjuntura, ainda particularmente incerta e volátil, requer serenidade na avaliação dos riscos.

Notou-se que as projeções de inflação para os anos de 2022 e 2023 estavam sujeitas a impactos elevados associados às alterações tributárias entre anos-calendário. Assim, o Comitê optou neste momento por dar ênfase à inflação acumulada em doze meses no primeiro trimestre de 2024, que reflete o horizonte relevante, suaviza os efeitos diretos decorrentes das mudanças tributárias, mas incorpora seus impactos secundários sobre as projeções de inflação relevantes para a decisão de política monetária.

Considerando os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar manter a taxa básica de juros em 0,50 ponto percentual, para 13,75% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete a incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos com variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva, e é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2023 e, em grau menor, o de 2024. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

(6) Próximos passos: A estratégia de convergência inflacionária passa pela manutenção dos juros por período suficientemente prolongado. O mercado continua precificando cortes de juros relevantes no decorrer de 2023, começando já no primeiro semestre. Nesse sentido, a Comunicação do BCB nos pareceu menos dura do que deveria, ainda que se tenha reconhecido a possibilidade de retomar as altas de juros se a convergência inflacionária não se concretizar.

O Copom considera que, diante de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário continue avançando significativamente em território ainda mais contracionista. O Comitê enfatiza que irá perseverar em sua estratégiaO Comitê se manterá vigilante, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período suficientemente prolongado será capaz de assegurar a convergência da inflação. O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado.

O Comitê avaliará a necessidade de um ajuste residual, de menor magnitude, em sua próxima reunião. O Copom enfatiza que seguirá vigilante e que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar a convergência da inflação para suas metas. Nota ainda que a incerteza da atual conjuntura, tanto doméstica quanto global, aliada ao estágio avançado do ciclo de ajuste e seus impactos acumulados ainda por serem observados, demanda cautela adicional em sua atuação

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Bruno Serra Fernandes, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Fernanda Magalhães Rumenos Guardado, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso, e Paulo Sérgio Neves de SouzaOs seguintes membros votaram por uma elevação residual de 0,25 ponto percentual: Fernanda Magalhães Rumenos Guardado e Renato Dias de Brito Gomes