DESTAQUE BRCG | Cenário 2025
Zona do Euro: Convergindo para a meta
Livio Ribeiro (livio.ribeiro@brcg.com.br)
13/02/2025
Bottom line: Ainda que com riscos relevantes, esperamos que a inflação europeia convirja para a meta no decorrer de 2025. Abre-se, assim, espaço para a continuidade do ciclo de afrouxamento monetário iniciado em 2024, até atingir uma taxa de juros terminal de 2,25%a.a. em meados do ano. Uma avaliação dos passos posteriores dependerá do balanço de riscos, da evolução do binômio atividade-inflação e das incertezas globais.
Como foi 2024: Aguentando pressões e reduzindo, de forma prudente, as taxas de juros.
Há alguns anos, a Europa tem sofrido pressões por todos os lados. Na agenda geopolítica, a manutenção do conflito entre Rússia e Ucrânia redesenhou a atuação da União Europeia, levando, inclusive, à mudança na postura tradicionalmente passiva dos estados nórdicos, que passaram a integrar a aliança militar da OTAN como forma de ampliarem as suas defesas frente a uma eventual futura agressão russa. Já na agenda econômica, houve aumento da pressão por gastos governamentais, especialmente de natureza militar e para a transição energética, em paralelo a um cenário de severa desorganização das cadeias produtivas de bens industriais.
O tecido econômico europeu se desorganizou, mas os cenários mais negativos não se confirmaram. Houve evidente dicotomia entre os setores de manufaturas e de serviços, contrapondo os problemas na produção de bens a um cenário mais robusto para o crescimento da demanda agregada europeia. A despeito de recorrente expectativa de uma recessão, a economia europeia se manteve em crescimento, mesmo que parco. A expansão (preliminar) do PIB na Zona do Euro foi de +0,7% em 2024, marcando o segundo ano consecutivo de crescimento inferior a +1,0%.
O comportamento do mercado de trabalho europeu foi digno de nota. Mesmo com o fraco desempenho do PIB, o desemprego atingiu o nível mais baixo da história da Zona do Euro (desde a adoção da moeda única, no início do século XXI), refletindo mudanças no comportamento do mercado de trabalho no pós-pandemia – algumas estruturais e outras conjunturais, mesmo que persistentes, refletindo novas políticas públicas e novos parâmetros de geração de valor adicionado na economia. Mais importante, os preços (salários) continuaram a crescer de forma relevante, dando suporte à absorção, notadamente no setor de serviços.
O desempenho dos salários tem sido motivo de escrutínio – e, em algum nível, de preocupação. São cada vez mais claras as evidências de que o crescimento real dos salários é inconsistente com o comportamento da produtividade europeia, levando a uma aceleração do custo unitário do trabalho (CUT) e a uma redução da competitividade, especialmente nos bens industriais. Mais ainda, a força dos salários reais tem pressionado a inflação doméstica, sendo o principal vetor a atrapalhar uma rápida convergência da inflação à meta de 2,0%. O tema tem recebido crescente atenção do Banco Central Europeu (ECB), mas a sua avaliação prospectiva sobre o tema ainda nos parece excessivamente benigna.
A inflação europeia cedeu no decorrer de 2024, com questões pontuais contribuindo até o início do 4º trimestre e movimentos não-lineares dos preços. Em outubro, a inflação ao consumidor acumulada nos 12 meses anteriores atingiu a meta de +2,0%, o que, para alguns analistas mais afoitos, foi interpretado como uma vitória da condução da política monetária. Parte relevante do movimento ocorreu devido a uma contribuição positiva dos preços de energia, o que já começou a ser revertido ao final do ano – em movimento antecipado pelo ECB, que manteve uma avaliação bastante sóbria da dinâmica inflacionária. A inflação ao consumidor encerrou 2024 em +2,4%, 0,5p.p. abaixo do ocorrido em 2023, mas com alguma pressão em serviços e evidências de moderada reaceleração dos núcleos de inflação.
Em cenário de crescimento frágil e progressiva redução das pressões inflacionárias, o Banco Central Europeu (ECB) iniciou os cortes de juros em sua reunião de junho. A postura da autoridade monetária europeia foi bastante cautelosa, sinalizando, durante todo o primeiro semestre, o início de um gradual afrouxamento monetário. Na sua reunião de junho, o ECB reduziu os juros referenciais europeus em 0,25p.p., indicando, de início, que não haveria ciclo – ou seja, cortes futuros seriam feitos em reunião espaçadas.
A estratégia do ECB foi recalibrada durante o 3º trimestre do ano, e a autoridade monetária europeia embarcou em um ciclo de afrouxamento monetário. Após pausa na reunião de julho, o ECB voltou a cortar as taxas de juros, sempre no ritmo de 0,25p.p., nas reuniões de setembro, outubro e dezembro, atingindo uma taxa terminal de 3,00%a.a. (taxa de remuneração dos depósitos). Foi notória a reavaliação do cenário prospectivo durante o 4º trimestre, estressando os riscos negativos para a atividade e um balanço de riscos liquidamente baixista para a inflação.
O ECB sinalizou mais conforto com o cenário prospectivo e mais confiança com o cumprimento da meta de inflação em 2025. Houve discussão sobre uma aceleração do ritmo de cortes para 0,50p.p. na reunião de dezembro, o que acabou não ocorrendo. Na tentativa de disciplinar o mercado, a presidente do ECB, Christine Lagarde, antecipou que haveria uma revisão das estimativas de juro neutro no início de 2025, e que provavelmente ele seria maior do que o anteriormente imaginado. Ainda assim, expressou mais confiança no cumprimento da meta de inflação de +2,0%, indicando que os juros continuariam a cair, moderadamente, durante os meses seguintes.
O que esperamos de 2025: Corte residual das taxas de juros e exacerbada volatilidade
O ECB sinaliza um ciclo de cortes de juros residual em 2025. Como amplamente esperado, o ECB cortou novamente as taxas de juros, por 0,25p.p., em sua reunião de janeiro. A autoridade monetária europeia seguiu com uma visão relativamente benigna do cenário, especialmente no front inflacionário, expressando confiança de que a inflação atinja a meta de +2,0%, e por lá permaneça, no decorrer do ano. Tudo se alinha para que novos cortes de juros sejam implementados no decorrer do primeiro semestre do ano, em nossa visão com um orçamento residual limitado. Esperamos mais dois movimentos de 0,25p.p. nas reuniões do ECB de março e abril, levando a taxa de juros referencial ao nível terminal de 2,25%a.a.
Haverá discussão sobre como se comportar ao atingir a taxa neutra de juros, no momento devido. Em função da sinalização prévia da autoridade monetária, esperamos discussões a respeito das diretrizes de política em meados do ano. Se os efeitos de uma desaceleração da atividade econômica mais intensa se sobrepuserem, haverá espaço para discutir uma política monetária levemente estimulativa (ou seja, com taxa de juros inferior a 2,00%.a.a). Se, por outro lado, a inflação se mostrar mais persistente, ou se o balanço de riscos se mostrar assimétrico para os preços, esperamos que o ECB sinalize manutenção da taxa de juros em 2,25%a.a. por período prolongado.
A despeito de evidentes riscos, principalmente os que emanam da guerra comercial, nos parece difícil que o ECB precise reverter o ciclo de afrouxamento monetário. Seria necessária uma grande surpresa inflacionária para que a autoridade monetária europeia modificasse seu plano de voo e voltasse a subir juros na segunda metade do ano. Sob cenários minimamente plausíveis, os juros europeus não voltarão a subir em 2025.
A avaliação prospectiva permanecerá nublada por eventos e choques externos. Um possível espalhamento da guerra comercial atingirá a já combalida atividade industrial europeia, em ambiente de crescimento da demanda interna privada menos intenso do que no passado recente. Há assimetria negativa para as projeções de crescimento do PIB de +1,1% em 2025, ainda que moderada nos cenários mais prováveis. Em paralelo, a inflação tende a oscilar ao sabor dos choques comerciais e de eventos específicos nas cadeias de alimentos e energia. Após alguma pressão no primeiro semestre do ano, esperamos uma convergência mais decisiva na direção da meta de +2,0% durante a segunda metade de 2025.
Um Euro fraco é fator a observar. Com perspectivas de dólar forte durante o ano, uma depreciação da moeda europeia pode ajudar a fazer frente aos prováveis choques comerciais, facilitando a busca por mercados fora da Zona do Euro. A baixa competividade, a desorganização das cadeias globais de valor e as pressões salariais, mesmo que declinantes, devem evitar que a indústria europeia possa se beneficiar, na totalidade, de uma taxa de câmbio mais competitiva. Atenção para eventuais retaliações comerciais, fato que pode complicar a evolução do binômio atividade-inflação durante 2025.
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Este relatório foi produzido pela BRCG utilizando dados públicos compilados até 12 de fevereiro de 2025 e possui caráter meramente informativo. O relatório é destinado a clientes e investidores institucionais, não podendo a BRCG e/ou os seus analistas serem responsabilizados por quaisquer perdas, diretas ou indiretas, derivadas de sua utilização. Este relatório não pode ser reproduzido, distribuído ou publicado por qualquer pessoa ou instituição, para quaisquer fins, sem a estrita autorização da BRCG.