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Decisão de política monetária | Comunicado do Copom (fev/22) – Andar com fé eu vou

02/02/2022

Bottom line: O Banco Central elevou a taxa Selic em 150bps na reunião de fevereiro, levando-a a 10,75%a.a, e sinalizou uma redução do ritmo de elevação da Selic na sua próxima reunião. Confirmou-se a nossa visão, não-consensual e expressa ainda na reunião de dezembro, de que, ao mudar o seu objetivo de cumprimento para convergência em relação às metas, o Banco Central estava se dando graus de liberdade para uma atuação mais suave já no início de 2022.  Reafirmamos o call de Selic terminal de 12,50%a.a. em 2022, com elevações de 100bps em mar/22 e de 75bps em mai/22, mas há risco real do orçamento oficial ser menor. Para 2023, esperamos cortes de 200bps nos juros a partir de meados do ano, levando a Selic a 10,50%a.a. 
 
O Banco Central elevou a taxa Selic em 150bps na reunião de fevereiro, referendando a sua sinalização recente, levando-a a 10,75%a.a. O movimento foi alinhado às expectativas, e, mais relevante, houve sinalização de redução do ritmo de elevação da Selic na próxima reunião do Comitê. Confirmou-se, dessa forma, a nossa visão não-consensual, expressa ainda na reunião de dezembro, de que, ao mudar o seu objetivo de cumprimento para convergência em relação às metas, o Banco Central estava se dando graus de liberdade para uma atuação mais suave já no início de 2022, aceitando uma inflação cadente no horizonte relevante, ainda que não estritamente aderente às metas estabelecidas pelo CMN.
O cenário de referência simulado pelo Banco Central parece ser suficientemente calibrado, ainda que nos pareça que a inflação de preços livres estimada pela autoridade monetária está excessivamente baixa. Isso é particularmente verdadeiro para 2022, quando inesperadamente o Banco Central reviu o seu cenário de preços administrados para 6,6%, mesmo com redução da bandeira tarifária de energia elétrica (de vermelha 2 para vermelha 1) para os dezembros de 2022 e 2023. Com Selic que atinge um pico de 12,00%a.a. em 2022, termina o ano em 11,75%a.a. e recua para 8,00% em 2023, o Banco Central enxerga IPCA de 5,4% em 2022 (preços administrados de 6,6% e preços livres de 5,0%) e de 3,2% em 2023 (preços administrados de 5,4% e preços livres de 2,6%) – a projeção de inflação oficial está na meta do ano que vem, e foco da política monetária já começou a migrar, oficialmente, para lá.
Nosso cenário base continua sendo de Selic atingindo 12,50%a.a. até a reunião de mai/22, permanecendo neste nível até meados de 2023. Com isso, geramos inflação de 5,1% em 2022 e de 3,3% em 2023. Números próximos aos oficiais, mas com composição bem diferente; nossos preços administrados são mais baixos (3,4% e 4,8%) e nossa inflação de preços livres é mais elevada (5,7% e 2,8%). Temos sistematicamente apontado que os modelos oficiais têm subestimado a inflação de preços livres, ou seja, enxergam uma potência da política monetária maior do que a de nossas estimativas.
Com uma política monetária que deve assegurar convergência às metas (e não o seu cumprimento), um deslocamento do horizonte relevante para 2023 e projeções condicionais que entregam a meta do ano que vem, o Copom sinaliza redução do ritmo de elevação da taxa básica na próxima reunião. Ainda que tenha enfatizado que irá perseverar na sua estratégia até que se consolide a desinflação e a ancoragem das expectativas, houve a confirmação do tom mais dovish que identificamos já no Copom de dezembro. 
 
“Andar com fé eu vou”: o Comitê faz a sua grande aposta nos efeitos defasados nas elevações já executadas. Resta saber se será bem sucedido, com expectativas ainda desancoradas e grande incerteza prospectiva (no mundo e no Brasil); “a fé não costuma falhar”.
Em conclusão, reafirmamos o call de Selic terminal de 12,50%a.a. em 2022, com elevações de 100bps em mar/22 e de 75bps em mai/22. Há risco real do Comitê entregar um orçamento um pouco menor do que os nossos modelos julgam ser necessário para garantir a convergência da inflação de 2023. Para o ano que vem, esperamos cortes de 200bps de juros a partir de meados do ano, levando a Selic terminal de 2023 a 10,50%a.a. Somente assim os nossos modelos colocam o IPCA em trajetória de convergência para a meta de 2024, definida pelo CMN em 3,0%.
Mais detalhes seguem abaixo. Como sempre, texto anterior em vermelho e novo texto sublinhado, com grifos onde julgamos relevante.
(1) Cenário externo: Cenário segue menos favorável, com risco de aperto mais célere dos juros nos EUA e questões sanitárias afetando tanto o ritmo de retomada como a normalização das cadeias produtivas
 
No cenário externo, o ambiente se tornousegue menos favorável. Alguns bancos centrais das principais economias expressaram claramente a necessidade de cautela frente à maior persistência da inflaçãoinflacionária aumenta o risco de um aperto monetário mais célere nos EUA, tornando as condições financeiras mais desafiadoras para economias emergentes. Além disso, a possibilidade de nova onda da Covid-19 durante o inverno e o aparecimento da variante Ômicron adicionamadiciona incerteza quanto ao ritmo da atividade, ao mesmo tempo que pode postergar a normalização das cadeias globais de recuperação nas economias centraisprodução
 
(2) Atividade doméstica: Tom um pouco mais benigno com o fim do ano, destacando o desempenho do mercado de trabalho. Parece-nos um pouco exagerado…
 
Em relação à atividade econômica brasileira, indicadores divulgados desde a última reunião mostram novamente umarelativos ao quarto trimestre tiveram evolução moderadamente abaixo da ligeiramente melhor que a esperada, em particular os relativos ao mercado de trabalho
(3) Inflação e expectativas: Inflação segue surpreendendo negativamente, principalmente nos núcleos. Expectativas de 2022 e 2023 estão acima das metas, mas o BCB não destacou isso.
 
A inflação ao consumidor continua elevada. A alta dos preços foi acima da esperada,seguiu surpreendendo negativamente. Essa surpresa ocorreu tanto nos componentes mais voláteis como tambémprincipalmente nos itens associados à inflação subjacente
 
As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação
 
As expectativas de inflação para 2021, 2022 e 2023 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 10,2%, 5,45,0% e 3,5%, respectivamente
 
(4) Projeções condicionais: Utilizando o cenário Focus, a Selic agora chega ao pico de 12,00%a.a. durante 2022, com corte marginal para 11,75%a.a. em 2022 e para 8,00%a.a., em 2023. As projeções oficiais, com esse cenário de juros, subiram para 5,4% em 2022 (vs. 4,7% no Copom anterior), mas mantiveram-se em 3,2% em 2023 – ou seja, rompendo a banda neste ano, mas na meta do ano que vem. O cenário parece, no geral, relativamente bem calibrado, ainda que continuem existindo peculiaridades – preços administrados nos parecem elevados em todo o horizonte projetado, em especial em 2022 (6,6%), ainda mais se considerarmos a diminuição da bandeira tarifária de energia elétrica para dez/22 e dez/23. Com isso, o cenário oficial de preços livres nos parece excessivamente baixo, em somente 5,0% em 2022 e em 2,6% em 2023. Nossa Selic terminal continua sendo de 12,50%a.a. neste ano, sendo mantida até meados de 2023. Geramos inflação de 5,1% em 2022 e de 3,3% em 2023, dividida entre preços administrados de 3,4% e 4,8%, e preços livres de 5,7% e 2,8%. 
No cenário básicode referência, com trajetória para a taxa de juros extraída da pesquisa Focus e taxa de câmbio partindo de USD/BRL 5,6545*, e evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC), as projeções de inflação do Copom situam-se em torno de 10,2% para 2021, 5,4% 4,7% para 2022 e 3,2% para 2023. Esse cenário supõe trajetória de juros que se eleva para 9,25% a.a. neste ano e para 11,75% a.a. durante 12% no primeiro semestre de 2022, terminandotermina o ano em 11,25%,75% e reduz-se para 8,00% a.a. em 2023. Nesse cenário, as projeções para a inflação de preços administrados são de 16,7% para 2021, 3,86,6% para 2022 e 5,4%5,2% para 2023. Adotam-se bandeira tarifária “escassez hídrica” em dezembro de 2021 eAdota-se a hipótese de bandeira tarifária “vermelha patamar 21” em dezembro de 2022 e dezembro de 2023
 
(5) Balanço de riscos e decisão: O balanço de riscos tem sutis mudanças no debate fiscal, não mais tratando de questões anticíclicas da pandemia e sim em mudanças que impliquem em impulso fiscal adicional e erosão da trajetória fiscal futura – o que poderia implicar em efeitos negativos sobre ativos (leia-se taxa de câmbio). Referendando a sua comunicação recente, o BCB elevou a Selic em 150bps, atingindo 10,75%a.a. A convergência continua sendo ao longo do horizonte relevante, e se olha, em maior grau, para 2023 – que está na meta. Confirma-se, portanto, nossa impressão de que a mudança de tom do Banco Central, ainda no Copom de dezembro, abriu espaço para uma postura mais suave, aceitando inflação cadente mesmo que sem atingir a meta (ou a banda em torno da meta) em 2022.
 
O Comitê ressalta que, em seu cenário básicode referência para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções
 
Por um lado, uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento nos preços das commodities internacionais em moeda local produziria trajetória de inflação abaixo do cenário básicode referência
 
Por outro lado, novos prolongamentos das políticas fiscais de resposta à pandemia que pressionem aimpliquem impulso adicional da demanda agregada eou piorem a trajetória fiscal futura podem impactar negativamente preços de ativos importantes e elevar os prêmios de risco do país
 
Apesar do desempenho mais positivo das contas públicas, o Comitê avalia que questionamentosa incerteza em relação ao arcabouço fiscal elevamsegue mantendo elevado o risco de desancoragem das expectativas de inflaçãomantendo e, portanto, a assimetria altista no balanço de riscos. Isso implica maior probabilidade de trajetórias para inflação acima do projetado de acordo com o cenário básicode referência
 
Considerando o cenário básicode referência, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa básica de juros em 1,50 ponto percentual, para 9,2510,75% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete seu cenário básicode referência e um balanço de riscos de variância maior do que a usual para a inflação prospectiva e é compatível com a convergência da inflação para as metas ao longo do horizonte relevante, que inclui oso anos-calendário de 2022 e, em grau maior, o de 2023. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego
(6) Próximos passos: Com uma política monetária que deve assegurar convergência às metas (e não o seu cumprimento), um deslocamento do horizonte relevante para 2023 e projeções condicionais que entregam a meta do ano que vem, o Copom sinaliza redução do ritmo de elevação da taxa básica na próxima reunião. Ainda que tenha enfatizado que irá perseverar na sua estratégia até que se consolide a desinflação e a ancoragem das expectativas, houve a confirmação do tom mais dovish que identificamos no Copom de dezembro. O Comitê aposta nos efeitos defasados nas elevações já executadas; resta saber se será bem sucedido, com expectativas ainda desancoradas e grande incerteza prospectiva (no mundo e no Brasil).
 
O Copom considera que, diante do aumento de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário avance significativamente em território contracionista. O Comitê enfatiza que irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas
 
Para a próxima reunião, o Comitê antevê outro ajuste da mesma magnitude.Em relação aos seus próximos passos, o Comitê antevê como mais adequada, neste momento, a redução do ritmo de ajuste da taxa básica de juros. Essa sinalização reflete o estágio do ciclo de aperto, cujos efeitos cumulativos se manifestarão ao longo do horizonte relevante. O Copom enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar a convergência da inflação para suas metas, e dependerão da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação para o horizonte relevante da política monetária.