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Decisão de política monetária – Comunicado do COPOM (nov/23): Descasamento entre discurso e atuação

Bottom line: O Banco Central reduziu a taxa de juros em 50bps na reunião de novembro, como amplamente esperado, trazendo-a para 12,25%a.a. Com aumento das incertezas prospectivas, o Comitê defende cautela. Isso não se traduziu, no entanto, em reavaliação do ritmo de cortes da Selic para as próximas reuniões (pelo menos até jan/24). Seguimos com Selic terminal de 11,75%a.a. em 2023 e de 9,00%a.a. em 2024, deliberadamente mirando projeções de inflação que não levem a uma infração do regime de metas durante o próximo biênio.

Em linha com a unânime expectativa do mercado, o Banco Central reduziu a taxa Selic em 50bps na sua reunião de novembro, trazendo-a para 12,25%a.a. Muito mais do que a decisão numérica, a grande questão estava na sinalização prospectiva, em específico como o Comitê combinaria as crescentes incertezas externas a eventuais mudanças tanto no seu balanço de riscos como na indicação dos próximos passos. Em alguma medida, o COPOM optou por uma solução de compromisso, na qual ajustes na avaliação do cenário não levaram a mudanças no ritmo sinalizado para as próximas reuniões.

Em termos qualitativos, o cenário externo ficou adverso – e não poderia deixar de ser descrito dessa forma. A desinflação continua, mas tanto headline como núcleos seguem acima da meta de inflação – fato que, também, não traz nenhuma novidade. Havia dúvida se o balanço de riscos se tornaria assimétrico, fosse pela questão externa, fosse pela derrocada da confiança nas metas propostas no arcabouço fiscal. Nesse aspecto, ficamos no meio do caminho: um tom implicitamente mais negativo, devido ao aumento das incertezas (externas), mas sem trazer a questão fiscal como um fator destacadamente negativo para o balanço de riscos.

Já em termos quantitativos, tivemos ajustes no cenário projetado. A inflação de 2023 caiu 30bps, para 4,70% (ou seja, não há infração do regime), em função da redução da hipótese de preços administrados – certamente a recente queda da gasolina é parte importante disso. Tanto para 2024 como para 2025, as projeções de inflação subiram 10bps, atingindo respectivamente 3,6% e 3,2%. Para o ano que vem, o grosso na mudança veio de nova hipótese de preços administrados, e, para 2025, a oscilação veio dos preços livres.

Os ajustes foram numericamente pequenos (o que entendemos como dovish), utilizando cenário de taxa de câmbio levemente mais depreciada e juros terminais 25bps mais elevados tanto em 2024 como em meados de 2025 – a trajetória, no cenário de referência, vê Selic terminal de 11,75% (2023), 9,25% (2024) e 8,75% (2025). O afastamento da projeção de 2025 da meta, no entanto, é um fator a ser observado adiante – principalmente porque, agora, os dois próximos anos possuem pesos equivalentes na avaliação do Comitê.

Por fim, é importante notar que temas mais negativos (reancoragem apenas parcial das expectativas e cenário externo desafiador) foram trazidos às considerações finais do Comunicado, ressaltando o tom de cautela apontado inúmeras vezes no texto. Essa “ponderação” na análise do cenário não se refletiu, no entanto, na sinalização prospectiva, com a unanimidade do Comitê antevendo a manutenção do ritmo de 50bps nas próximas reuniões (ou seja, pelo menos em dez/23 e em jan/24). Esse descasamento entre discurso (mais cauteloso) e atuação (manutenção do ritmo de cortes) deve dar o tom das discussões nas Minutas, exacerbando as diferenças entre as alas mais dovish e hawkish do Comitê.

Em conclusão, seguimos com as mesmas críticas de sempre ao cenário traçado pelo Comitê – a potência monetária sugerida pelos modelos oficiais nos parece exagerada, e nossas projeções de inflação são mais elevadas do que as oficiais. Deliberadamente calibrando o nosso call para uma não-infração do regime de metas (ou seja, inflação projetada na banda de oscilação da meta) tanto em 2024 como em 2025, seguimos esperando que a Selic recue até 9,00%a.a. em meados do ano que vem, em um longo ciclo de flexibilização com ritmo de 50bps por reunião, até um ajuste final de 25bps na reunião de set/24. Reforçamos o nosso entendimento, inúmeras vezes exposto, de que o cumprimento da meta deixou de ser o real objetivo da autoridade monetária.

Mais detalhes seguem abaixo. Como sempre, texto anterior em vermelho e novo texto sublinhado, com grifos onde julgamos relevante.

(1) Cenário externo: Cenário piora e é definido como adverso, incluindo elevação dos juros americanos, resiliência da inflação subjacente, novas tensões geopolíticas e necessidade de convergir a inflação em ambiente de mercado de trabalho pressionado. Atenção e cautela demandadas pelos emergentes (sinal mais hawk vindo de fora).

O ambiente externo mostra-se mais incerto, com a continuidade do processo adverso, em função da elevação das taxas de desinflação, a despeito juros de prazos mais longos nos Estados Unidos, da resiliência dos núcleos de inflação em níveis ainda elevados e resiliência nos mercados de trabalho deem diversos países e de novas tensões geopolíticas. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas. O Comitê notou a elevação das taxas de juros de longo prazo dos Estados Unidos e a perspectiva de menor crescimento na China, ambos exigindo maior atenção em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho. O Comitê avalia que o cenário exige atenção e cautela por parte de países emergentes

(2) Atividade doméstica: Sem quaisquer mudanças no cenário de atividade, que segue consistente com a desaceleração esperada pelo Comitê. No debate inflacionário, segue a desinflação, mas o tom fica levemente mais duro ao lembrar que o headline segue acima do compatível com o cumprimento da meta. A inflação subjacente, por sua vez, segue acima da meta de inflação.

Em relação ao cenário doméstico, observou-se maior resiliência da o conjunto dos indicadores de atividade econômica do que anteriormente esperado, mas o Copom segue antecipando um consistente com o cenário de desaceleração da economia nos próximos trimestres. Como antecipado, ocorreu uma elevação da pelo Copom.

(3) Inflação e expectativas: Segue a desinflação, mas o tom fica levemente mais duro ao lembrar que o headline está acima do compatível com o cumprimento da meta. As mudanças nas expectativas estão concentradas em 2023.

A inflação cheia ao consumidor acumulada em doze meses no período recente. As manteve trajetória de desinflação, mas segue acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta de inflação, enquanto as medidas mais recentes de inflação subjacente apresentaram queda, mas ainda se situam acima da meta para a inflação. As expectativas de inflação para 2023, 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 4,6%4,9, 3,9% e 3,5%, respectivamente

(4) Projeções condicionais: Ajustes nas projeções condicionais em todo o horizonte relevante, com direções distintas e em magnitude bastante moderada. No curto prazo, a projeção de 2023 caiu 30bps, refletindo ajuste na hipótese de preços administrados. As projeções de 2024 e 2025 subiram 10bps cada, com movimento no ano que vem derivado dos preços administrados e, em 2025, dos preços livres. Foram ajustes muito pequenos, associados a novas hipóteses de taxa de câmbio (R$ 5,00/US$ vs. R$ 4,90/US$) e juros terminais, de 11,75%a.a. em 2023, 9,25%a.a. em 2024 (9,00%a.a. no COPOM anterior) e de 8,75%a.a. em meados de 2025 (8,50%a.a. no anterior). Note-se, no entanto, que a projeção de 2025 vai ficando cada vez mais fora do lugar, o que pode começar a pesar…

As projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência* situam-se em 5,04,7% em 2023, 3,6%,3,5 em 2024 e 3,2%3,1 em 2025. As projeções para a inflação de preços administrados são de 10,59,3% em 2023, 4,5 5,0% em 2024 e 3,6% em 2025

(5) Balanço de riscos e decisão: Há uma pequena mudança de tom no balanço de riscos, com uma menção adicional à incerteza da conjuntura exigindo cautela e representando, em si, alguma assimetria negativa. Note-se que o Comitê evitou deixar isso explícito, inclusive sem trazer, para os fatores de risco, a discussão da persecução das metas fiscais (que segue em parágrafo separado). O horizonte relevante agora tem iguais pesos para 2024 e 2025.

O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; e (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (ii) os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado. O Comitê avalia que a conjuntura, em particular devido ao cenário internacional, é mais incerta do que o usual e exige cautela na condução da política monetária

Tendo em conta a importância da execução das metas fiscais já estabelecidas para a ancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, para a condução da política monetária, o Comitê reforça reafirma a importância da firme persecução dessas metas.

Considerando a evolução do processo de desinflação, os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu reduzir a taxa básica de juros em 0,50 ponto percentual, para 12,25%,12,75 a.a., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2024 e, em grau menor, o de 2025. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego

(6) Próximos passos: Há certo ajuste na narrativa, trazendo questões mais negativas (reancoragem apenas parcial das expectativas e cenário global desafiador) ao corpo do Comunicado. Esse tom mais cauteloso não ganha eco na sinalização prospectiva, mantendo a sinalização de que o Comitê vê a velocidade de 50bps como adequada para as próximas reuniões – ou seja, já falando da reunião do fim de jan/24. O centro de gravidade das discussões já muda para este horizonte.

A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento e por, expectativas de inflação com reancoragem apenas parcial e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária. O Comitê reforça a necessidade de perseverar com uma política monetária contracionista até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas.

Em se confirmando o cenário esperado, os membros do Comitê, unanimemente, anteveem redução de mesma magnitude nas próximas reuniões e avaliam que esse é o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário. O Comitê ressalta ainda enfatiza que a magnitude total do ciclo de flexibilização ao longo do tempo dependerá da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as daquelas de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.

Votaram por uma redução de 0,50 ponto percentual os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Ailton de Aquino Santos, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Fernanda Magalhães Rumenos Guardado, Gabriel Muricca Galípolo, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso e Renato Dias de Brito Gomes.